Para uma menina aprisionada
Um turbilhão passava de um lado e de outro. As pessoas iam velozes, para o trabalho e uma fuligem difusa espalhava-se pelo ar, de ambos os lados da avenida.
Lá no centro, tinha um canteiro castigado: a grama seca pela falta de chuva, leprosa, pequenos arbustos esfomeados, uma árvore sem raça. Detritos de todos os tipos bailavam sem ritmo na sarjeta empoeirada.
Era lá que o pequeno cão sem nome morava, desde que, uma manha, ele fora acorrentado no tronco carcomido. Crescera ali, alimentado diariamente pelo guardador de carros que depositava gentilmente, a cada manhã, restos de comida.
A coleira de couro depilara seu pescoço frágil e, quando a chuva caia, ele corria para o pequeno abrigo de madeira compensada que uma senhora caridosa empurrara para o canteiro central.
De manhã, ele despertava com os primeiros zumbidos dos motores. Deitado e sonolento, ele observava o movimento dos carros, espreguiçando-se lentamente ate onde a corrente o deixava alcançar. Aos poucos o movimento ficava mais excitante e ele corria a exercitar-se em volta da árvore, em movimentos concêntricos e cada vez mais curtos. De um lado e de outro, de um lado e de outro.
Por vezes, pedestres apressados tocavam-lhe levemente a testa. Ele fazia festa, mostrava a língua, ensaiava um pulo. Eram seus momentos preferidos por que eram raros.
O pequeno cão mendigava carinho no canteiro central da avenida e era feliz com aquilo. Feliz com sua vida diminuta, seu aconchegante cárcere, sua porção de horizonte e afeto.
Afinal ele crescera ali, o pequeno cão, e era feliz de nada saber das pradarias, dos bosques, de um tapete felpudo aos pés da lareira, de um riso de criança.
E naquele dia normal, naquele dia cinza, quando levaram o pequeno cão não sei para onde, fiquei triste, triste.
Era uma manhã qualquer e o pequeno cão não estava mais lá. Roubaram-me a sua alegria.
Saudade do pequeno cão sem nome e seu reflexo feliz de viver. Saudade de mim de antes.
Fernand Alphen

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